Inspirado no artigo escrito por Johnn Four (Roleplayingtips.com)
Tradução e adaptação por Hayako
Nós, humanos, não mudamos muito desde que estávamos na savana, há milênios atrás. Nossos gatilhos de luta ou fuga ainda funcionam da mesma maneira hoje do que quando éramos macacos preocupados com leões, cobras e o escuro. “Lutar ou fugir” é um pouco impreciso. Eu já li bastante essas coisas, principalmente livros e artigos sobre neurociência, psicologia e comunicação. E na verdade deve ser Lutar, Fugir ou Travar (Fight, Flight or Freeze). Existem três estados em que nosso cérebro pode nos colocar quando confrontados com conflitos e estresse psicológico.
Para novos(as) Mestres e para aqueles(as) que ainda não encontraram seus estilos e ritmos de jogo, você pode ficar bastante estressado(a) atrás do escudo de mestre. E o estresse ao mestrar não é diferente do estresse da savana:
• Hormônios como cortisol e adrenalina inundam sua corrente sanguínea;
• Aumento da frequência cardíaca e pressão arterial;
• A respiração muda para respirações mais curtas e superficiais;
• O sangue flui do cérebro, olhos e intestino para membros e tronco, em preparação para o esforço físico.
E é esse último ponto que atinge os novos GMs com mais força.
Mestrar Não É Fácil
Um jogador mencionou para mim outro dia como começou a narrar seus próprios jogos. Ele ficou surpreso com o quão difícil é o trabalho do Mestre. “Mesmo apenas gerenciar a mesa de jogo é algo complexo por si só”, disse ele. Há muita coisa acontecendo. Leitura e estudo. Preparação e criação. Organização e logística. Habilidades de lidar com pessoas. Improviso. Resolução de conflitos no jogo e entre jogadores. Contar histórias e decidir ante as regras. E assim por diante. O que pedimos aos nossos cérebros para o nosso amado passatempo é demais.
Conhece-te a Ti Mesmo(a)
Depois que tomei consciência do estresse de mestrar, pesquisei e comecei a prestar atenção às minhas reações em todos os tipos de situações estressantes. Aprendi que, em geral, minha reação é a de Fugir. Embora em algum momento eu trave primeiro. Isso significa que, quando meu modo de estresse é acionado, quero colocar distância entre o fator estressante e eu. Meu cérebro desencadeia as respostas dos tópicos lá acima, e toda essa energia quer entrar em alguma forma de recuo.
Comecei a perceber essa resposta em outras pessoas no trabalho. Quando surgiram conflitos, vi pessoas se “encolhendo” ou inquietas. A linguagem corporal mudou. Os braços se colam ao corpo. O queixo desce. Os olhos vagam de um lado para o outro ou ficam baixados. Elas ficam quietas. Uma perna começa a balançar. Essas pessoas estão se preparando para correr. O estranho é que, uma vez que me tornei consciente da minha reação padrão ao estresse, eu pude mudar isso.
Agora, não quero mudar minha admirável e instantânea resposta do cérebro ao perigo. Não quero mudar para o modo de luta quando deveria estar correndo como duendes que vêem um bruxo brincando com uma bola de guano e um punhado de enxofre. Mas, em algumas circunstâncias, não preciso correr. Como na mesa de jogo.
Abrace o Estresse e Use-o a Seu Favor
Você sabia que o estresse pode afetar sua memória e outras funções cerebrais? Não há problema quando em estado selvagem e fugindo de tigres dentes-de-sabre. Mas na mesa de jogo, o estresse pode criar um ciclo negativo: gatilhos de estresse; a função cerebral fica prejudicada; a situação termina e a resposta ao estresse termina; você não se lembra muito do evento; você provavelmente evita pensar sobre isso depois.
Portanto, você não aprende com isso. E então isso vai acontecer de novo, e de novo. O que diminui sua autoconfiança. “Por que eu sou uma merda nisso? Por que isso sempre acontece?”. O que torna o sua Narração pior. O que dispara o estresse com mais frequência e às vezes com maior gravidade. Putz. Mas você pode evoluir. Mude a si mesmo(a) para que, quando as condições de estresse surgirem à mesa, você canalize essa energia em entusiasmo e, estranhamente, em mais carisma.
O estresse faz você querer evoluir. Isso te deixa animado(a). Essas mudanças fisiológicas acontecem. Sua presença muda. Se reconhecido, adotado e alavancado, o estresse faz de você um(a) Mestre melhor. Portanto, pense no estresse como uma oportunidade. Algo para entender melhor e aproveitar.
Como Lidar com o Estresse na Mesa de Jogo
Sua primeira tarefa é reconhecer quando o estresse te ataca durante os jogos.
Reconhecimento
Se você se conscientizar de quando está operando sob estresse, pode tomar contramedidas e usá-lo bem. Portanto, identificação e conscientização são a primeira coisa.
Contrarresposta Física
Quando você reconhecer que o estresse foi atingido — sempre será tarde demais, então você precisará fazer isso enquanto estiver estressado — realize algumas ações rápidas para se organizar. Primeiro, respire fundo algumas vezes com o diafragma/forçando a barriga. Mude a respiração rápida e superficial do peito para inspirar até plenos pulmões — especialmente os pulmões inferiores através das respirações diafragmáticas (respire forçando a barriga e sincronize sua inspiração/expiração com a imagem abaixo).
Segundo, levante-se e mova-se. Faça o sangue fluir novamente para o seu cérebro.
Contrarresposta Mental
Torne-se “presente” mais uma vez. A respiração e o movimento o ajudarão a recuperar a acuidade mental. E sua intenção anterior de manter a autoconsciência ajudará a colocar seus pensamentos de volta no jogo. Afaste-se dos pensamentos desencadeados pelo estresse, que geralmente incluem conversas negativas e pensamentos improdutivos sobre temas com agressão ou diminuição dos outros. Coloque um Post-It na sua frente ou outro lembrete para usar estas técnicas quando a tensão te golpear.
Identifique a Fonte
Às vezes, ficamos estressados quando aquele jogador faz suas presepadas ou quando as personagens fazem o inesperado. No caso de um(a) mestre iniciante, minha hipótese é que há:
• Tantos fatores tomando sua atenção…
• Com pressões para responder…
• De altas auto-expectativas…
• E as expectativas imaginadas dos jogadores…
• Com o pior cenário possível, os medos trazidos pelas falhas do passado e as preocupações pré-jogo…
E essas condições mentais desencadeiam estresse.
Descobri que quando adquiri mais experiência como Mestre, construí uma boa biblioteca de respostas. Ter esses itens no bolso reduziu ou eliminou muitas reações de estresse. Quando três jogadores me fazem perguntas de uma vez, já tinha experiência para lidar com isso. Quando cometo um erro eu lido com isso calmamente: ou recuo e refaço a cena, ou conserto após a cena com ajuda dos jogadores, ou simplesmente a coisa toda não aconteceu e bola pra frente.
Quando um jogador me surpreende ao interagir com PdMs (Personagens de Mestre = NPCs, em inglês) que não preparei eu sabia o que fazer, mesmo que meu estratagema fosse ganhar tempo para pensar. Então, você quer descobrir o que causa estresse durante os jogos. Depois, você pode preparar ferramentas e apoios de Mestre para ajudá-lo(a) a responder melhor da próxima vez. Assim que você identificar um gatilho de estresse, anote-o e use-o como uma oportunidade de aprendizado ou de preparação de jogos.
Por exemplo, nomes derrubam muitos(as) Mestres. A página Fantasy Name Generators está nos favoritos do meu navegador. Na verdade, eu usei na sessão da noite passada três vezes. Problema resolvido na hora e sem estresse!
Seja Paciente
Minha hipótese é que os novos(as) Mestres ficam agitados(as) rapidamente pelas demandas do jogo, o que cria um novo ciclo de resposta: você fica estressado(a) facilmente; os níveis de desempenho caem; o estresse volta ainda mais rápido ou permanece; repetição.
Às vezes, identificar uma fonte e tratá-la metodicamente é como um jogo de “acerte a toupeira”: você desce o martelo em uma questão e uma mais profunda aparece para substituí-la. Por exemplo, você resolve o problema do nome com uma lista ou gerador e percebe que está se estressando com a personalidade e a aparência do PdM. Você descobre uma solução para isso, e no próximo jogo você fica estressado ao tentar interpretar seus PdMs. Você descobre soluções para isso e fica estressado com a falta de papel na história e ganchos na trama dos PdMs. E por aí vai.
Não os vejo como uma série de falhas. De jeito nenhum. Eu vejo isso como a jornada do(a) Mestre do jogo. É uma série de aprendizados. É um caminho para dominar seu ofício. A jornada é essencial e realizada apenas narrando mais jogos. Portanto, permita-se aprender errando. Seja paciente. É uma maratona, não 100 metros rasos, e prepare-se para encontrar muitos momentos de aprendizado ao longo do seu caminho.
O Que Fazer Quando Travar
Nós colocamos o estresse em seu lugar. Não vai a lugar nenhum. E não queremos suprimi-lo porque é nosso professor. Em vez disso, planejamos adotá-lo e fazer bom uso dele.
Depois de identificar que o estresse atacou, tome essas medidas defensivas físicas e mentais. Em seguida, procure identificar a causa. Enquanto faz isso, convém fazer uma pausa para reunir seus pensamentos. É uma forma de resposta de fuga controlada contra estresse. Afaste-se da situação imediata que está causando estresse no seu cérebro: relaxe por um minuto; pense nas suas opções; escolha a melhor opção; continue narrando a cena.
Você já pode ter encontrado uma técnica específica para a situação acima, chamada Ciclo OODA (tradução livre minha). Desenvolvido pelo famoso piloto John Boyd, ele usou essa sequência psicológica como um passo-a-passo para obter muitas vitórias:
Observar — Veja a realidade da situação;
Orientar — Remova preconceitos como conversa negativa interna e expectativas irreais, e analise a situação;
Decidir — Escolha a melhor opção como hipótese;
Agir — Realize a ação e retorne a Observar para começar a avaliar os resultados.
Essa estrutura mental fornece uma estrutura fantástica para reduzir o estresse. Embora eu esteja longe de aperfeiçoar essa resposta, o Ciclo OODA me permite ser mais objetivo e reflexivo durante situações que, de outra forma, me derrubariam e me colocariam em uma resposta improdutiva de fuga por mais de alguns segundos. Assim como a interpretação, é um mecanismo para sair de si mesmo e tornar-se consciente. É uma maneira de ver algo através de uma lente diferente e aprender com essa experiência. Também descobri que o Ciclo OODA esvazia as respostas de luta e travamento. Relaxe os músculos e observe e oriente com um olhar objetivo. Tome uma atitude. Veja o que acontece sem culpa ou remorso.
Macetes Rápidos para PdMs
Infelizmente, não existe pílula mágica para o estresse de Mestrar. Você precisa continuar narrando jogos e aprendendo. Mencionei um exemplo específico, pessoal, então concluirei este artigo com algumas dicas rápidas para interpretar os PdMs:
Pessoas-Modelo
Escolha uma pessoa na vida real ou em uma história que você conheça bem e torne-a um PdM no momento. Por exemplo, os jogadores querem interagir de surpresa com o guarda do portão. Então você escolhe aquele seu tio doido e interpreta o PdM como ele. Faça uma lista de 10 pessoas ou personagens que você poderia interpretar facilmente e mantenha-a à mão enquanto você narra.
Escolha uma Característica
Paralisar pra Analisar (tradução livre para Analysis Paralysis) combinada com o desejo de narrar como um(a) ator/atriz profissional sabota o seu jogo. Fique no feijão-com-arroz. Escolha um aspecto interessante e baseie seu PdM nisso.
Aqui estão 200 características de PdM — role uma aleatoriamente e interprete-a. Se achar complicada, role de novo.
Escolha Três Características
Quando quiser, dedique 15 minutos para fazer uma lista de PdMs para improviso rápido. Dê a cada PdM um nome e três características:
O traço 1 é um traço positivo.
O traço 2 é um traço negativo.
O traço 3 é um segredo ou surpresa.
Por exemplo:
Giles (Filosófico, Mentiroso, Cruel)
Anthol (Esbanjador, Desconfiado, Amoral)
Aeric (Contemplativo, Chato, Independente)
Willes (Atrapalhado, Irritante, Espiritualista)
Altira (Comunicativa, Orgulhosa, Justiceira)
Ewisie (Inteligente, Enxerida, Rebelde)
Koila (Rebelde, Raciocínio Lento, Preocupada)
Cenwiu (Barulhento, Selvagem, Sombrio)
Gilew (Bobo, Grosseiro, Sobrevivente)
Wynte (Charmoso, Brega, Preocupado)
Acho que três características ou referências simples fornecem parâmetros de improvisação suficientes para que seus PdMs sejam mais profundos do que os unidimensionais.
Convoque os Jogadores
Se você ficar preso em um PdM, peça a um(a) jogador(a) para detalhá-lo.
Teresa: “Eu ando até a guarda, todo indiferente, e pergunto a eles como está indo o turno deles”.
Mestre de Jogo: “Ei, Sandro, me ajude aqui e me diga uma coisa interessante sobre um desses guardas”.
Sandro: “Bem, ele tem um nariz muito grande. Ah, e ele tem medo de cavalos. Ele pula toda vez que alguém passa trotando pelo portão”.
MJ: “Perfeito. Obrigado! Ok, Krug, você percebe o nariz do guarda primeiro. Praticamente lança uma sombra mais longa que a do guarda. Então você vê ele olhando de soslaio uma carroça que se aproxima. Ele parece estar ficando nervoso por algum motivo”.
MJ: [voz rouca] “O turno tá indo bem, obrigado por perguntar. Vamos conversar por aqui, mais perto do muro. Não quero ser atropelado por uma carroça agora, hahahaha … *fungando*”.
Mantenha a Calma e Continue Mestrando
Minha hipótese é que Mestres iniciantes ficam perturbados porque mestrar exige muito do nosso cérebro, e as condições da mesa causam estresse. Essa tensão reduz temporariamente sua capacidade, resultando em um ciclo de retorno que induz mais estresse. Sugiro gerenciar suas reações ao estresse com algumas das técnicas apresentadas para que você permaneça em seu estado mais capaz.
Identifique suas fontes de estresse e tome medidas preventivas entre os jogos, preparando alguns apoios em sua Caixa de Ferramentas de Mestre. Por último, e mais importante, continue mestrando! Com o tempo fica mais fácil à medida que você cria um inventário de ideias e respostas para as diversas situações que ocorrem durante o curso de uma campanha.
